quarta-feira, 17 de junho de 2020

Culto e Iconografia da Nossa Senhora da União de freguesias de Além da Ribeira e Pedreira

Introdução
A origem deste assunto, teve como base o trabalho “Culto e Iconografia da Nossa Senhora no Concelho de Tomar” de Maria do Céu C. Tavares – Professora do Ensino Secundário. Claro está falarei apenas nas Nossas Senhoras existentes nas Igrejas e Capelas da união de freguesias de Além da Ribeira e Pedreira, correndo o risco de estar incompleto mas sempre adaptável a novas informações. O meu objetivo é perpetuar esta informação e dar a conhecer estes  “pequenos pormenores” da nossa arte religiosa. Para tal usei fotografias minhas e outras retiradas do “facebook”.
É evidente a importância da presença de Maria (mãe dos Homens a quem habitualmente chamamos de Nossa Senhora) para as comunidades que continuam a prestar-lhe culto. Falo sobre a iconografia[1] Mariana. Temos presentes vários exemplares  de Invocações Marianas na Junta de Freguesia de Além da Ribeira e Pedreira, tais como: o Imaculado Coração de Maria (Igreja Matriz da Portela da Vila),  a Nossa Senhora de Fátima (Igreja Matriz da Portela da Vila, Capela de São Lourenço – Póvoa, Capela da NSra das Lapas - Lapas), a Nossa Senhora das Neves-Pedreira, Nossa Senhora das Lapas – Lapas e a Nossa Senhora de Mildeu – agora em Calvinos.   
Por exemplo, na Póvoa apesar de a festa ser em honra de S. Lourenço na sua procissão vai sempre a imagem de Nossa Senhora, transportada (quase sempre) pelas raparigas da terra.
 Figura 1 – Procissão Festa da Póvoa – 1948 -com Maria Henriques (Mãe do Rui Figueira) e Alzira, irmã da Felicidade "da Cruz". De Manuel Rosa – Turma do Rio facebook 

Figura 2-Procissão da Póvoa ano? – De Margarida Pacheco facebook



[1] Com origem no vocábulo latim iconographĭa, o conceito de iconografia engloba qualquer descrição referente a quadros, telas, imagens, monumentos, estátuas e retratos. O termo está relacionado com o conjunto de imagens (principalmente aquelas que são antigas) e com o relatório ou exposição descritiva sobre estas.
A iconografia, como tal, pode definir-se como a disciplina que se focaliza no estudo da origem e na elaboração das imagens e das respectivas relações simbólicas e/ou alegóricas.

Figura 3-Procissão da Póvoa 1962 De:ToZé Rosa-Turma do Rio - facebook
Figura 4 - Procissão da Festa da Póvoa - 1995 – facebook

Figura 5 - Procissão Festa da Póvoa Agosto 2013

O culto de Nossa Senhora teve início logo nos primeiros tempos da Igreja. Este culto, chamado hiperdulia, é diferente do que se presta aos santos, dulia, e do culto que se reserva a Deus, adoração ou latria.
No decurso do ano litúrgico, ao celebrar os acontecimentos da vida de Cristo aos quais Maria esteve intimamente associada, na sua qualidade Mãe de Deus, a Igreja recorda o papel que ela desempenhou na salvação dos homens.
Atualmente a distribuição das festas em honra da Nossa Senhora, no Calendário Geral Romano, é a seguinte:
Janeiro – 1 – Santa Maria Mãe de Deus
Fevereiro – 2 – Apresentação do Senhor
Março – 25 – Anunciação do Senhor
Maio – 31 – Visitação da Virgem Maria – Imaculado Coração de Maria – no sábado seguinte à Solenidade do Sagrado Coração de Jesus.
Julho – 16 – Nossa Senhora do Carmo
Agosto – 5 – Dedicação da Basílica de Santa Maria Maior
-15 – Assunção da Virgem Maria
-22 – Santa Maria Virgem Rainha
Setembro – 8 – Natividade da Virgem Maria
Outubro – 7 – Nossa Senhora do Rosário
Novembro – 21 – Apresentação da Virgem Maria
Dezembro – 8 – Imaculada Conceição da Virgem Maria

A ICONOGRAFIA MARIANA
O gosto pela representação de Nossa Senhora terá surgido logo entre as primeiras comunidades cristãs da Palestina, do Médio Oriente, do Egipto e, mais tarde, nas comunidades de Roma.
Os exemplos mais antigos, conhecidos da iconografia mariana datam do século III: A Virgem com o Menino e um Profeta, na Catacumba de Priscila, em Roma.
Invocações Marianas e sua Iconografia na freguesia
Imaculado Coração de Maria – Igreja Matriz da Portela da Vila
Celebra-se esta festa no sábado seguinte à festa do Coração de Jesus que tem lugar na sexta-feira depois da Oitava do Corpo de Deus (ambas as festas móveis).
A devoção ao Coração de Maria é antiga na Igreja e tem as suas raízes em numerosas passagens do Evangelho: Lucas 2,19; Lucas 1,37; João 19,25-27 e outras.
O culto a Maria sob esta invocação deve-se a S.João Eudes que já em 1643 o celebrava com os seus religiosos tendo-se esta festa tornado pública em 1648. Em 1805, o Papa Pio VII autorizou as Dioceses e Institutos Religiosos a celebrar esta festa e Pio IX, em 1855, aprovou a Missa e o Ofício para algumas localidades. No século XIX nasceram muitos Institutos Religiosos consagrados ao Imaculado Coração de Maria e decidiu perpetuar este gesto impondo a festa, em 1944, a todo o Rito Romano. Os Papas que se lhe seguiram não deixaram de exortar os Bispos a consagrar as suas Dioceses  ao Imaculado Coração de Maria.
Nesta iconografia, a Virgem de Branco – síntese de todas as cores – e descalça estende os braços. A mão direita segura, em geral o Rosário ou aponta para o coração que por vezes, aparece com um resplendor de luz e coroado de espinhos – símbolo  do seu amor.
Figura 6- Imaculado Coração de Maria - Igreja da Portela da Vila - Agosto 2015
Nossa Senhora das Neves - Pedreira
É a festa romana mais antiga em honra da Virgem, celebra-se a 5 de Agosto e comemora a dedicação da Basílica de Santa Maria Maior, em Roma, pelo Papa Sisto III, em 432. Diz a tradição que, no lugar da construção desta Igreja, apareceu neve em tempo de calor.
Esta devoção  foi introduzida em Portugal no século XIV e é, atualmente, uma das mais difundidas.
Na Igreja Matriz da Pedreira, existe uma escultura de madeira policromada do século XVII (?). nossa Senhora tem um manto pela cabeça e segura o Menino sobre o braço esquerdo, cruzando o direito sobre este. O Menino segura um livro na mão esquerda.

Figura 7- Nossa Sra das Neves [1]

[1] Pedreira, Junta de Freguesia da Pedreira, Maio 2010
Nossa Senhora de Fátima – Igreja Matriz da Portela da Vila e Capela de São Lourenço na Póvoa
O culto a Nossa Senhora de Fátima teve como ponto de partida as aparições de Nossa Senhora a três pastores, Lúcia, Francisco e Jacinta, no dia 13 de Maio de 1917, na Cova da Iria.
 No dia 21 de Janeiro de 1927 a Sagrada Congregação dos Ritos autorizou a celebração da Missa Votiva do Rosário no Santuário e, numa carta Pastoral, datada de 13 de Outubro de 1930, o bispo de Leiria declarou “dignas de crédito as visões das crianças na Cova da Iria” e permitiu oficialmente o culto de Nossa Senhora de Fátima. O Papa João Paulo II consagrou-lhe o Mundo no dia 13 de Maio de 1982.
Este culto difundiu-se rapidamente por todo o Mundo. Ao Santuário de Fátima acorrem inúmeras peregrinações nacionais e estrangeiras sobretudo nos meses de Maio e Outubro.
Na iconografia desta invocação, Nossa Senhora aparece coroada, de mãos postas, em atitude orante, e com um terço delas pendente. A túnica e o manto comprido, pela cabeça são brancos, com dourado nas orlas.
 Os pés, descalços ou calçando sandálias, apoiam-se sobre uma peanha de nuvens que é caraterística desta iconografia. Também aparece por vezes a Nossa Senhora (imagem no andor da Póvoa) com doze estrelas à volta da sua cabeça, estas representam a Doutrina dos Doze Apóstolos de Cristo. O terço representa as orações pedidas por Nossa Senhora aos pastorinhos, a túnica e o manto branco representam a sua pureza [1]
Acrescento uma pequena curiosidade sobre a Coroa de Nossa Senhora de Fátima e devido ao seu valor pode-se compreender o porquê de nem todas as imagens terem a coroa.

“A coroa mais importante de todas as ofertas à Nossa Senhora de Fátima, está guardada no  Edifício da Reitoria de frente à capelinha das aparições, na exposição "Fátima Luz e Paz"
Esta coroa está cheia de simbolismo e fé (para alguns coincidência).
As primeiras aparições tiveram inicio em 13 de Maio 1917, durante a I Guerra Mundial em que Portugal esteve presente, e apesar de muitos não acreditarem foi prometido e feito o milagre, a guerra terminou.
Em agradecimento por Portugal, e os seus maridos, não integrar a II Guerra Mundial as mulheres portuguesas ofereceram em 1942 o seu ouro, que foi fundido e criada a coroa mais importante, que apenas sai da galeria nos dias das cerimónias principais no Santuário de Fátima.
A bala, que em 13 de Maio de 1981, atingiu o Papa João Paulo II, foi oferecida em agradecimento por ter sobrevivido ao atentado que segundo percebi mas não consegui confirmar terá ocorrido as 19:17, retirando a separação 1917 (ano das aparições).
Aqui entra a fé (ou a coincidência) a bala foi colocada na coroa por baixo da bola azul, que simboliza o globo, num orifício que sempre existiu desde a criação da coroa em 1942[2]

Figura 8 - Andor da Nossa Sra de Fátima - Festa da Portela da Vila - Agosto  2015

Figura 9 - Nossa Sra de Fátima - Capela da Póvoa - Agosto 2013

Figura 10 - Andor da Nossa Sra de Fátima - Festa da Póvoa - Agosto 2013

Figura 11 - Nossa Sra de Fátima-Lapas 2019
Nossa Senhora das Lapas – Lapas
A imagem da Santa é uma peça com cerca de 8 cm e é talhada num único pedaço de marfim (talvez dente..? (Arsénio, 1997 (?)) -. Está representada na posição de sentada, com uma coroa, um manto e o menino ao colo[3].
Lenda da Nossa Sra. das Lapas
Em tempos muito remotos andando um pastor por aquele sítio, tão cheio de precipícios, foi encontrar uma gruta atapetada de avencas e perfumadas violetas uma linda imagem de Nossa Senhora!
Ficou assombrado de pasmo o pobre pastor, de olhos muito arregalados, contemplando aquela Santa, aureolada de luz celestial, e deslumbrante formosura!
Largas horas permaneceu em êxtases, sem poder abandonar a resplandecente visão!
Declinava o Sol na altura das nuvens, e só então despertou e passando a mão à espera pela vista, murmura: Nossa Sra. da Lapa!
Corre apressado por tortuosos caminhos e levar a nova da sua descoberta.
Sabedores do Santo milagre, despovoaram-se as aldeias próximas de longe mesmo, vinham grupos de peregrinos adorar a Virgem!
Tal foi a fé daquele povo, que em breve resolveram edificar a sua capelinha em frente da gruta, e para lá transportaram a sua imagem.
Mas … sempre, que de manhãzinha, abriam a porta da capela (não esqueçais que era oposta à gruta), não encontravam a Sra. no altar, indo depois achá-la nas íngremes penedias onde aparecera!
Debatiam-se em mil conjeturas os pobres camponeses sem poderem explicar a causa do fenómeno, até que um dos mais sábios lá da aldeia, deu o seu parecer sobre o estranho sucedido. É que Nossa Sra. quer ir visitar todas as suas noites a sua primeira morada, e á volta perde o norte, à entrada da sua Capela.
Abre-se-lhe pois, outra porta mesmo em frente da gruta, e já a Sra. poderá entrar e sair todas as vezes que quiser.
Assim procederam, imediatamente e nunca mais, dizem eles na sua boçal ignorância, Nossa Sra. deixou de ser encontrada no seu altar.
“Todos os anos, em Agosto, se realiza a Festa da Nossa Sra. da Lapa, com missa cantada e arraial, concorrendo imensos devotos, que vão render graças à sua Padroeira, e munidos dos seus farnéis, passam o resto dos dias nas margens do Nabão, junto à capelinha. É lindo o rio naquele sítio, apesar das suas perigosas penedias. F.O.” “Ecos de Tomar” de 29 de Janeiro de 1925

Figura 12 - Nossa Senhora das Lapas - 2019

Figura 13 - Nossa Sra das Lapas - Turma do Rio - Facebook
Nossa Senhora de Mileu (ou Mildeu*Amorim Rosa) 
“Ignora-se a origem desta invocação. Segundo a lenda, Nossa Senhora teria dito a um seu devoto que, para mil mouros, bastava um cristão ou ainda “para mil eu”, teria dito um devoto de Nossa Senhora aos que o advertiam que fugisse dos mouros. Há, no entanto, várias imagens de Maria veneradas com este título.
Na Ermida de Nossa Senhora dos Anjos de Calvinos, freguesia de Casais, existe uma escultura do século XVI, em pedra policromada. Nossa Senhora aparece com Coroa incorporada e o Menino sobre o braço esquerdo. Ambos seguram uma pomba – símbolo da plenitude da sua graça.
Falo sobre esta Nossa Senhora pois segundo algumas investigações (através do Sr. Hilário Guia)...existiu a Capela da Nossa Senhora de Mildeu (Santa esta, que agora está na Capelas dos Calvinos fundada a 1737[4]) ainda em território da freguesia, e assim não cai no esquecimento.
“Em 1530, suposta data da criação da freguesia, existiam as seguintes ermidas com os respectivos oragos: Santa Maria da Lapa, à borda do Rio, defronte à Póvoa; São Lourenço, no lugar da Póvoa; S. Silvestre, além do Carvalhal, perto de João Prestes; S. Domingos, que está entre as Olas e a Torre; Santa Maria do Mildeu, perto dos Calvinos; e Santo Izidoro, que está nas Várzeas de Assamassa.”[5]

                                             Figura 14 - Certidão de Nascimento em Mildeu – 1731
                                    Figura 15 - Ruínas da Capela da Mildeu - perto da Azenha do Curto
Por último, faço também uma breve referência a duas imagens conhecidas que se encontram na Capela de São Lourenço – Póvoa, pois além de serem figuras santas (é verdade que não correspondem ao culto mariano), simbolizam a entrega da sua vida à Oração e aos outros (mais evidente na Rainha Santa Isabel).
A Rainha Santa – Isabel de Aragão – Capela de São Lourenço - Póvoa 
Escultura da Rainha Santa onde podemos ver a sua coroa (símbolo da realeza) e com um manto azul.
Dona Isabel, infanta de Aragão (filha de Pedro III) e rainha de Portugal (mulher de Dom Dinis), nasceu, segundo a tradição, no ano de 1271 e foi santificada pelo papa Urbano VIII a 25 de Maio de 1625. Pelo caminho, deixou o testemunho material de uma vida dedicada às boas obras, na figura de clarissa de que fez dotar o seu moimento, marcando, com grande significado, uma intenção bem determinada de deixar de si a memória de uma fiel devota.”[6]


              Figura 16- A Rainha Santa - Dona Isabel de Aragão- Capela São Lourenço -2013

Santa Clara – Capela de São Lourenço – Póvoa
Escultura representativa da Ordem das Clarissas fundada por Clara de Assis (1194-1253), como ramo feminino dos franciscanos. Santa Clara tem o seu hábito, identificado pelo cordão de vários nós que o cinge ao nível da cintura, Livro de Horas (?) na mão esquerda
 “A nossa Ordem nasceu da inspiração do Senhor a S. Francisco de Assis, para viver na Igreja segundo a forma do santo Evangelho, e Sta Clara de Assis participou desta Vocação, por isso somos chamadas, Irmãs Clarissas; formamos a 2ª Ordem Franciscana.[7]
“Outro detalhe entre as religiosas da Ordem passava pela vocação para a confeção de doces e da junção de plantas destinadas a curar maleitas. “Como eram requisitadas pela nobreza laboraram muito a doçaria conventual, mas também tinham aqui uma botica com muitas ervas que tinham fama de cura. Sabiam curar por meio de experiências de plantas. Muita gente entrava aqui para conseguir cura e elas também forneciam hospitais, pobres e peregrinos para curar pequenas doenças”, resume o padre David Barbosa Sampaio.[8]


Figura 17 - Santa Clara - Capela de São Lourenço - 2013
Conclusão

Este é um pequeno levantamento das esculturas existentes nos templos religiosos da junta de freguesia, com incidência nas Nossas Senhoras, desde tempos longínquos que existe esta devoção, mais recentemente (e porque já havia alguém com máquina fotográfica)-1948 podemos ver o gosto da população manter as procissões onde veneram os seus santos. Fica em aberto a continuidade deste trabalho.